Em uma sociedade desorientada, que não consegue mais reconhecer o certo e o errado, onde cada pessoa fabrica a própria “verdade” e quer seguir os seus instintos mais baixos, a desordem se instala e percebemos claramente seus prejuízos. A vida desordenada perde totalmente o seu sentido, entretanto, a maioria das pessoas não reconhece a necessidade de colocar as coisas em seu devido lugar. Você percebe?
O que é um dogma?
O Catecismo da Igreja católica1, no parágrafo 88, nos ensina: “O Magistério da Igreja faz pleno uso da autoridade que recebeu de Cristo quando define dogmas, isto é, quando propõe, dum modo que obriga o povo cristão a uma adesão irrevogável de fé, verdades contidas na Revelação divina ou quando propõe, de modo definitivo, verdades que tenham com elas um nexo necessário.
Ou seja, um dogma de fé é uma verdade religiosa considerada fundamental e indiscutível dentro de uma tradição religiosa, especialmente no contexto do cristianismo. Os dogmas são ensinamentos oficiais que são declarados pela autoridade da Igreja, reconhecidos como revelados por Deus e, portanto, exigem aceitação e adesão por parte dos fiéis.
No parágrafo 89, o Catecismo da Igreja católica nos ensina: “Existe uma ligação orgânica entre a nossa vida espiritual e os dogmas. Os dogmas são luzes no caminho da nossa fé: iluminam-no e tornam-no seguro. Por outro lado, se a nossa vida for reta, a nossa inteligência e nosso coração estarão abertos para acolher a luz dos dogmas da fé”.2
Para quem entende, os dogmas são um néctar de vida
Com a explicação teórica, os dogmas parecem um pouco frios? Dão a impressão de uma dureza, de regras rígidas? Precisamos avançar no entendimento prático da aplicação dos dogmas em nossas vidas, para que colhamos os frutos de uma existência ordenada e cheia de sentido.
Dom Luis Maria Martínez2, no livro O Espírito Santo: seus dons, seus frutos, sua ação, disse: “As verdades que Deus se dignou revelar-nos não são apenas luz, mas também ‘espírito e vida’; não são apenas um sistema doutrinal sublime e completo: são palavras de vida eterna, sementes fecundíssimas que transformaram o mundo quando foram difundidas pelos Apóstolos, e que transformam as almas quando estas lhe abrem a inteligência e o coração e fazem delas um néctar de vida”.
Uma abordagem filosófica sobre os dogmas
Em outro trecho do mesmo livro, Dom Martínez, reflete: “O influxo do dogma na vida cristã estabelece cada coisa em seu devido lugar, evitando assim os desvios de piedade que surgem de inclinações pessoais ou de uma visão limitada e pouco esclarecida. Estes, apesar de piedosos e bem-intencionados, podem impedir o desenvolvimento rápido e robusto da perfeição cristã nas almas. Colocar cada coisa em seu devido lugar é mais crucial na vida espiritual do que muitos consideram”.
A frase do Bispo mexicano aborda a importância do dogma na vida cristã, enfatizando seu papel em organizar e guiar a prática espiritual de maneira correta e eficaz. Sob uma perspectiva filosófica, podemos analisar alguns pontos centrais dessa reflexão.
Primeiramente, o dogma pode ser visto como um conjunto de princípios fundamentais que estruturam a crença e a prática religiosa. Ele funciona como um alicerce que oferece estabilidade e coerência, prevenindo desvios que poderiam resultar de interpretações subjetivas ou incompletas da fé. Filosoficamente, isso remete à necessidade de normas e diretrizes para a manutenção da ordem e da harmonia, tanto na vida individual quanto na coletiva. Que tipo de resultados pode alcançar uma sociedade sem normas e instrumentos de ordenamento da vida?
Em segundo lugar, a menção aos “desvios de piedade” sugere que, sem um guia sólido como o dogma, a prática religiosa pode se tornar excessivamente influenciada por emoções e tendências pessoais. Embora essas inclinações possam ser genuínas e belas, elas não garantem necessariamente um progresso sólido e equilibrado na vida espiritual. Isso reflete uma visão aristotélica da ética, onde a virtude é encontrada na moderação e na aderência a princípios racionais, em vez de se deixar levar por impulsos.
Além disso, a frase sublinha a ideia de que a verdadeira perfeição cristã — ou seja, o crescimento espiritual e a santidade — depende de uma base doutrinária firme. Isso ecoa a filosofia de Platão sobre a importância das ideias imutáveis e perfeitas (as Formas) como guias para a realidade sensível. Sem uma compreensão clara e correta dessas “Formas” (no caso, os dogmas), o desenvolvimento espiritual pode ser prejudicado.
Por fim, a declaração de que “colocar cada coisa em seu devido lugar” é crucial destaca uma concepção de ordem e hierarquia no cosmos e na vida espiritual, similar à visão de filósofos como Santo Tomás de Aquino, que integra a filosofia aristotélica com a teologia cristã. Aquino argumenta que a razão e a fé não são opostas, mas complementares, e que a razão pode ajudar a esclarecer e aprofundar a fé.
Você pode viver isso
Em resumo, a reflexão de Dom Martínez pode ser entendida como uma defesa do papel essencial do dogma na estruturação da vida espiritual, garantindo que cada aspecto da fé e da prática religiosa esteja alinhado e harmonizado, permitindo um desenvolvimento pleno e robusto da perfeição cristã. Uma vida ordenada por Deus pode trazer alegria e paz acima de qualquer promessa passageira de sucesso. Experimente!
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Referências:
1. CATECISMO DA IGREJA CATÓLICA. Novíssima edição de acordo com o texto oficial em latim. 4. Ed. São Paulo: Loyola, 2017.
2. Cf. Jo 8, 31-32.
3. MARTINEZ, L. M. O Espírito Santo: seus dons, seus frutos, sua ação. 1ª Ed. Dois Irmãos, RS: Minha Biblioteca Católica, 2024.