Ninguém mais assume seus erros? Negar a culpa é negar a própria cura, ensina Venerável Fulton Sheen
Existem maneiras totalmente incoerentes de buscar a cura da culpa por nossos erros. Bem cedo, a criança que quebrou o vaso de porcelana da mãe aprende que só há paz na consciência depois de assumida a culpa e da promessa de tomar mais cuidado da próxima vez, seguida de um abraço e pedido de perdão à parte ofendida. O que as crianças aprendem, adultos negam e vivem doentes, encarcerados na culpa e no orgulho, buscando culpados por suas próprias faltas. É preciso encarar esse problema de frente, e Venerável Fulton Sheen fez isso com habilidade ímpar.
Negar a culpa é negar a própria cura
Venerável Fulton Sheen, no livro “A Paz da Alma”1, disse: “[…] analistas ateus dizem ao paciente, em um momento, que este estava determinado a ser como o é pelos impulsos infantis ou pelo instinto de manada, de modo que o próprio paciente não é responsável por seus erros; no momento seguinte, dizem que, agora, é responsável por sua condição futura. Isso é frustrar uma pessoa dizendo-lhe, ambiguamente, que ela é livre e não o é”.
Você já parou para pensar na falta de coerência que há em dizer que alguém é livre para ser o que quiser, tomar suas decisões e alcançar um empoderamento, ao mesmo tempo em que não tem nenhuma culpa por tudo de errado que já fez, pois o ambiente e os traumas definiram suas más escolhas? Ora, como pode uma “vítima da sociedade” ter autonomia para tomar as rédeas da própria vida?
O mundo está doente
Fulton Sheen prossegue seu raciocínio dizendo que: “Pedir ao paciente que se ajuste ao seu meio não é curá-lo, mesmo que ele possa obedecer a tal orientação; pois o ambiente do mundo hoje está em um considerável estado de desajuste. É concebível que alguns pacientes estejam muito bem ajustados ao seu meio; no entanto, precisam da sugestão de Nosso Senhor: ‘Vinde vós, aqui à parte, a um lugar deserto, e repousai um pouco’ (Mc 6,31)”.
Se o mundo está visivelmente doente, como pode alguém se curar ajustando-se ao mundo? É por isso que as ideologias, que tentam forçar as pessoas a seguirem um padrão para não serem canceladas, são mais causa de dor e doença do que solução. Faz sentido alguém buscar a cura para uma doença contagiosa abraçando outros doentes com feridas purulentas abertas? O tratamento das nossas emoções passa por uma espiritualidade sadia, que não nega a ciência, mas que reconhece o peso insubstituível da fé e dos momentos de intimidade com Deus no recolhimento.
Todo psicanalista é um exemplo de perfeição moral?
No mesmo livro, o Venerável se aprofundou na questão e explicitou a incoerência na conduta de muitos psicanalistas: “Como pode o próprio psicanalista ser a fonte do novo e necessário poder de cura — particularmente se ele mesmo teve de ser psicanalisado? Como disse Nosso Senhor, se um cego guiar outro cego, ambos cairão na cova (cf. Mt 15,15; Lc 6,39). E quem estabeleceu o analista como um protótipo para que qualquer pessoa o tome como normal? A psicanálise baseada em uma filosofia materialista não pode oferecer nenhuma norma, nenhum ideal, nenhuma motivação, nenhum dinamismo, nenhum propósito na vida; nada disso tem para ofertar. No entanto, ainda deve haver um ideal; cada pessoa não pode ser seu próprio modelo, caso contrário, quais de nós são loucos e quais não o são?”.
Quando um paciente se abre para alguém que se coloca como o porto seguro, digno de ouvir seus mais íntimos anseios e medos, pode se decepcionar ao descobrir que ancorou sua confiança no vento. Como pode alguém guiar no caminho da boa conduta moral para a cura interior se tal pessoa não é uma autoridade moral em sua própria conduta? Mesmo sendo incoerente, muitos pacientes acabam vendo no seu psicanalista um porto seguro.
Precisamos de um modelo ideal
Venerável Fulton Sheen arremata seu raciocínio de maneira magistral, ao dizer que: “Nem o pessoal, nem o coletivo, nem o analista podem oferecer ao paciente o padrão pelo qual clama, o ideal pelo qual lutar. Só pode haver um ideal para vários diferentes ‘eus’ se houver uma Pessoa Perfeita da qual essa e aquela pessoa, ambas, participem e reflitam. No desenvolvimento pessoal, tal como na arte, não podemos progredir a menos que tenhamos o ideal da perfeita beleza. […] O cristianismo oferece tal libertação apresentando a Pessoa Ideal de Cristo, que oferece poder e recursos a todos os ovos quebrados para se tornarem normais novamente: ‘Dei-vos o exemplo’ (Jo 13,15), isso significa ‘Eu sou o Modelo, o Protótipo e uma Pessoa’. O afastamento da mente de Cristo Jesus é a origem das desordens; a integração à imagem de Cristo é a fonte de toda paz e contentamento”.
Mesmo que o mundo atual não reconheça e até mesmo persiga o ideal cristão, ninguém encontrará a paz e o contentamento enquanto não ajustar a sua vida aos ensinamentos da Pessoa Perfeita, que é o caminho, a verdade e a vida. Jesus Cristo só pode ser seguido pelos mansos e humildes de coração, que assumem suas próprias culpas e limitações para serem curados pelo seu Sangue redentor. E que leveza libertadora isso traz! Eis a paz de Cristo, que supera todo o entendimento, e nunca será explicada pela ciência humana.
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1. SHEEN, F. J. A Paz da Alma. 1ª Ed. São Paulo: Molokai, 2022.
2. FONSECA, A. O. Frase de Venerável Fulton Sheen sobre o afastamento de Cristo Jesus. Altair Fonseca. Disponível em: https://www.youtube.com/watch?v=Ua8uDinJWqk. Acesso em: 21 de maio de 2024.