Ícone do site Altair Fonseca

O que é a Eucaristia para você? Saiba mais sobre o tão sublime Sacramento e entenda o que é a transubstanciação

O que é a Eucaristia?

O que é a Eucaristia?

O que é a Eucaristia para você? Infelizmente, muitos católicos não entendem o mistério de um Deus que se faz pão para habitar sensivelmente em nós. Por se tratar de um milagre de amor que ultrapassa o nosso entendimento, muitas vezes caímos no erro de tratar a Sagrada Comunhão como algo banal e perdemos os benefícios do momento tão sublime de recebermos Jesus Cristo em nós. Precisamos refletir sobre o tão sublime Sacramento.

O que é a Eucaristia para você?

Iniciamos este conteúdo com uma breve reflexão em vídeo para depois nos aprofundarmos filosófica e teologicamente sobre o tão sublime Sacramento. Pense comigo:

O que é a Eucaristia para você?1

O que há por trás do tão sublime Sacramento da Eucaristia?

Dr. Peter Kwasniewski2, em artigo traduzido pela equipe Christo Nihil Praeponere, nos diz que um dos maiores mistérios da nossa fé é a presença real de Nosso Senhor e Salvador Jesus Cristo na Sagrada Eucaristia. Entretanto, a incredulidade e a heresia insistem em levantar objeções que só podem ser combatidas por teólogos que, reconhecendo com humildade os limites da razão, estudam em oração o divino e o sobrenatural.

Nos tempos atuais, com a modernidade e o tecnicismo científico, o ceticismo com relação a tudo o que é sobrenatural invadiu até mesmo universidades, seminários e paróquias, que contam com escarnecedores da fé inclusive em importantes cargos eclesiásticos. De fato, para quem não tem disposição para se esforçar em estudo e oração, a resposta mais fácil é duvidar de tudo o que exige mais fé e trabalho intelectual.

A nossa razão é sempre desafiada pelos grandes mistérios da fé. Pensando nisso, Dr. Peter Kwasniewski diz: “Ao contrário de um músculo, que fica cansado ou mesmo machucado pelo uso, nossa mente se fortalece à medida que a usamos, como Aristóteles afirmou há muito tempo. Menciono Aristóteles, o filósofo racional por excelência, não apenas por ser meu filósofo grego favorito (todos devem ter um favorito), mas porque na realidade ele legou a Santo Tomás as ferramentas conceituais para debater a transubstanciação. Embora o mistério jamais deixe de ser uma maravilha e um milagre que supera todo o pensamento humano, pode ser explicado à mente de modo que não mais pareça uma contradição ou impossibilidade colossal”.

Precisamos usar mais a nossa mente

Uma pequena base filosófica

Se você realmente quer entender o que é a transubstanciação, precisa empregar um pouco de esforço intelectual e contar com a graça de Deus, que sempre ilumina a inteligência humana. Respire fundo e vamos lá.

Para avançarmos no entendimento, precisamos entender a diferença entre “substância” e “acidente”. Embora o uso moderno dessas duas palavras seja um pouco restrito, no campo filosófico seu sentido é muito amplo.

A palavra “substância” significa qualquer coisa que exista em si mesma e por si mesma (como, por exemplo, um cavalo, uma árvore, um homem, uma pedra). A substância tem natureza própria, diferente de uma cadeira, por exemplo, que é o resultado de um trabalho que reúne diferentes substâncias naturais. Ou seja, a cadeira não existe por si mesma, mas é fabricada, não podendo ser considerada uma substância.

O termo “substância” deriva de sua função: é “aquilo que está por baixo” (latim substantia; grego hypostasis), diferente do “acidental” (latim accidens; grego: symbebekos), que é aquilo que sucede à, acontece com, pertence à substância. Uma substância existe em si, ao contrário do que existe numa substância.

Entenda que características como tamanho, formato, cor, peso, virtude, paternidade, filiação são exemplos de coisas que existem numa substância, não em si mesmas. Tais características existem verdadeiramente, mas pertencendo a algo. Por exemplo, nunca vemos a brancura, mas vemos um gato branco ou uma parede branca; não podemos ver a justiça, mas reconhecemos um homem justo ou uma lei justa. O conhecimento só tem existência na mente daquele que conhece, pois é um acidente próprio de sua alma.

Os acidentes se dividem em dois grupos: o genérico (acidente não próprio) e o próprio, também conhecido como “propriedade”. Os acidentes não próprios, ou genéricos, podem vir a ser e desaparecer na mesma substância. Um exemplo dessa realidade é um homem pálido que pode tornar-se moreno por causa do bronzeamento; o mesmo pode ser dito de um homem desprovido de conhecimento musical, que pode se tornar músico e, pela falta de treinamento, perder essa habilidade.

Por outro lado, os acidentes próprios estão enraizados na natureza de uma substância, de maneira que sempre estão presentes quando a substância está presente. Por exemplo, a capacidade de falar ou pensar deriva da natureza racional do ser humano. São chamados acidentes porque existem apenas numa substância e são chamados próprios porque são próprios de determinadas substâncias e sempre as acompanham.

É importante entender que alguns acidentes são permanentes e outros, mutáveis. O acidente existe em, ou é próprio de, um sujeito subjacente. A única exceção a essa regra é o mistério da Eucaristia, no qual, pelo poder divino, os acidentes do pão e do vinho existem sem um sujeito subjacente. Eis o milagre da transubstanciação!

Nós adquirimos o conhecimento sobre a realidade através de nossos sentidos, dessa forma, só conseguimos perceber diretamente apenas as características acidentais das coisas. Portanto, a existência de determinada substância é percebida facilmente a partir de nossa experiência dos entes individuais (esta mulher, este cachorro) e da impossibilidade de uma característica abstrata (altura, justiça, brancura) existir separada de um sujeito modificado por ela. Uma pessoa pode mudar de cor ou de peso, adquirir ou perder virtudes sem deixar de ser a mesma pessoa. Sendo assim, substância é o princípio que permanece a todas as outras características.

Chegamos então a uma compreensão mais profunda de substância: trata-se daquilo que verdadeiramente é, o fundamento essencial, diferente do que é derivado ou mutável. Sendo assim, às vezes, a essência de uma coisa é chamada de sua substância, pois a natureza ou essência é aquilo que faz uma coisa ser o que ela é — e, por extensão, a existência [ou o ser] de uma coisa pode ser chamada de substância. Usado dessa forma, o termo substância já não significa o fundamento no qual estão assentados os acidentes. Portanto, quando Deus é chamado de substância, ou as Pessoas da Trindade são chamadas de hypostases, ou falamos da união hipostática entre as naturezas humana e divina em Jesus Cristo, não sugerimos que haja acidentes correspondentes próprios da existência de Deus ou do Verbo. Coisas que são acidentes na alma de uma criatura racional (como seu conhecimento e suas virtudes) são, em Deus, idênticas ao seu ser. Ou seja, Jesus Cristo e o Espírito Santo não são acidentes de Deus Pai, mas fazem parte de sua essência na Trindade (o Deus Uno em três Pessoas).

Você sabia? O termo “substância” foi incorporado à teologia cristã desde muito cedo, diante de controvérsias a respeito da Encarnação e da Santíssima Trindade. O Concílio de Niceia (325), ao defender a divindade de Cristo, afirma que o Filho é homoousian (latim consubstantialis) — isto é, da mesma substância, da mesma essência divina — em oposição aos arianos, que o chamavam homoiousian, “de substância parecida”.3 Na Idade Média, quando o mistério da Eucaristia como verdadeiro Corpo e Sangue de Cristo foi questionado por Berengário de Tours, os termos substância e acidente foram empregados para formular a doutrina ortodoxa.

O que é a transubstanciação?

Já que é o mistério central de nossa fé, “fonte e ápice da vida cristã”, é justo que a Igreja considere a Sagrada Eucaristia o objeto de sua mais profunda adoração e mais rigorosa vigilância.4 Para compreendermos o motivo pelo qual a Igreja utiliza o termo “transubstanciação” para o milagre que ocorre no momento da consagração, precisamos pressupor duas verdades: primeiro, que a Eucaristia é realmente o Corpo e o Sangue de Cristo; segundo, como contrapartida necessária, que pão e vinho realmente se transformam em Corpo e Sangue.

As duas verdades apresentadas são ensinadas na Sagrada Escritura5 e comprovadas sem sombra de dúvidas pelos Padre da Igreja do Ocidente e do Oriente. Para alguns autores gregos, a mudança que ocorre nos dons chama-se metousiosis, ou mudança de uma substância (ousia) em outra; até hoje os teólogos ortodoxos orientais que permanecem fiéis à herança patrística estão fundamentalmente de acordo com o dogma católico, mesmo que usem uma terminologia diferente e menos precisa.6 O termo latino transubstantiatio apareceu no final do século XI e foi apresentado oficialmente no IV Concílio de Latrão (1215). Opondo-se às heresias eucarísticas dos autodenominados reformadores, o Concílio de Trento (1545-1563) reafirmou solenemente a doutrina, observando que seu significado, mesmo sem a atual nomenclatura, foi sempre e em todos os lugares a fé comum da Igreja.

Por que a transubstanciação é milagrosa?

A transubstanciação é considerada milagrosa no sentido mais forte do termo exatamente porque trata-se de algo que está completamente fora do curso ordinário da natureza, porque nessa mudança misteriosa, os acidentes ou características do pão e do vinho permanecem, enquanto a substância interior, a realidade essencial, torna-se algo completamente diferente. O Concílio de Trento ensina que no momento da consagração, em virtude das palavras eficazes de Nosso Senhor proferidas por seu ministro, a substância inteira do pão é transformada na substância inteira do Corpo de Cristo, e a substância inteira do vinho é transformada na substância inteira do Sangue de Cristo. Pão e vinho enquanto tais deixam de existir, e a plena realidade de Cristo se torna presente sob suas aparências, cuja permanência nos dá a possibilidade de consumir os dons divinos. Os acidentes do pão e do vinho, portanto, permanecem sem qualquer substância à qual possam estar inerentes, e a substância de Jesus Cristo se torna presente sem que os seus acidentes ou características sejam sensíveis para nós. Eis o mistério da fé!

Dr. Peter Kwasniewski ao refletir sobre este grande milagre, diz: “Devemos nos maravilhar com a conveniência dos meios escolhidos por Nosso Senhor: pão e vinho são fontes evidentes de nutrição para o corpo. Portanto, simbolizam perfeitamente o alimento espiritual que a alma recebe na Sagrada Comunhão. Os acidentes duradouros desses alimentos permitem que o comungante receba de modo incruento o verdadeiro Corpo e Sangue do Senhor e, consequentemente, sua alma e divindade, de um modo adequado a nós e às nossas capacidades”. 

Portanto, ao recebermos a Sagrada Comunhão, Jesus Cristo vem ao nosso encontro e habita em nós da maneira mais íntima possível, abençoando e transformando nossa alma e corpo com a santidade de sua divina humanidade. Se o corpo humano normalmente transforma o alimento em sua própria substância, ao recebermos a Eucaristia dignamente (ou seja, em estado de graça), nós somos totalmente envolvidos pela graça de Deus e gradativamente transformados em sua imagem e semelhança.

Dr. Peter Kwasniewski sobre Jesus na Eucaristia

Há diferença na comunhão em duas espécies?

Carne e Sangue do Senhor ressuscitado no céu se tornam verdadeiramente presentes por meio das palavras da consagração. Dessa forma, a hóstia consagrada contém também — “por concomitância”, para usar a linguagem de Santo Tomás e do Concílio de Trento — seu Sangue, Alma e Divindade, pois estes são inseparáveis daqueles. Eles sempre acompanham o Corpo (o verbo concomitare significa apenas atender, acompanhar, ir junto). O mesmo vale para o vinho, que é transformado em Sangue de Cristo em virtude das palavras da consagração, mas no qual estão presentes, por concomitância, o Corpo, a Alma e a Divindade do Salvador. Essa é a razão pela qual a comunhão apenas sob uma espécie, pão ou vinho, não diminui em nada a recepção do Cristo inteiro, Verbo feito carne, ainda que a significação do valor de sinal do sacramento seja mais completa na recepção sob as duas espécies, algo que a Igreja Católica considerou adequado limitar ao sacerdote que oferece o sacrifício. Porém, desde o Concílio Vaticano II, a prática da comunhão sob duas espécies [para os fiéis] foi amplamente disseminada na Igreja latina. 

Podemos concluir que, independentemente da riqueza ou pobreza com que nossas liturgias retratam os mistérios da fé, precisamos fazer mais do que ir à igreja uma vez por semana, se quisermos conhecer, amar e viver nossa sagrada religião. O estudo é parte disso, e Santo Tomás de Aquino é nosso guia de confiança. Que ele interceda por nós, para que possamos voar com as duas asas: a da fé e a da razão.

Dr. Peter Kwasniewski é formado pelo Thomas Aquinas College e pela Universidade Católica da América. Lecionou no Instituto Teológico Internacional na Áustria, no Programa Áustria da Universidade Franciscana de Steubenville e no Wyoming Catholic College, que ajudou a estabelecer em 2006. Hoje ele é um escritor em tempo integral e palestrante sobre o catolicismo tradicional que escreveu muitos livros e publica em uma grande variedade de sites. Sua obra foi traduzida para vinte idiomas. Visite seu site pessoal em www.peterkwasniewski.com.

Gostou deste conteúdo? Compartilhe e ajude a evangelizar!

Referências:

1. FONSECA, A. O. O que é a Eucaristia para você? Altair Fonseca. Disponível em: https://www.youtube.com/watch?v=fkJPm45Fkd4. Acesso em: 19 de maio de 2024.

2. KWASNIEWSKI, P. Transubstanciação: um guia para iniciantes. Padre Paulo Ricardo. Disponível em: https://padrepauloricardo.org/blog/transubstanciacao-um-guia-para-iniciantes. Acesso em: 19 de maio de 2024.

3. A expressão “um i não faz diferença” é uma indelicadeza racionalista contra a precisão teológica dos nossos antepassados. Um i faz toda diferença entre o cristianismo e o paganismo elegante de Ário. 

4. Ver Lumen Gentium 11, Catecismo da Igreja Católica 1324. Dificilmente poderíamos culpar a doutrina oficial da Igreja por muitas vezes serem deficiente essa adoração e vigilância, particularmente nas últimas décadas. Esse fenômeno resulta mais da decadência da autoridade, da falta de disciplina eficaz e da gradual perda do senso de Tradição entre os fiéis, tal como Romano Amerio documentou em seu livro Iota Unum

5. Ver, inter aliaJo 6, 48-60; Mt 26, 26-28; Mc 14, 22-24; Lc 22, 19-20; 1Cor 10, 16-17; 11, 23-29.

Sair da versão mobile